terça-feira, 31 de maio de 2016

A saúde mental em “Bicho de sete cabeças”

Por Aracely Coutinho

        O filme baseado em fatos reais conta, em um tom documental, a história de Neto, um adolescente comum que passa pela fase da rebeldia habitual da idade. Sem qualquer exame prévio, ele é internado de forma involuntária em um hospital psiquiátrico após ser flagrado de posse de um cigarro de maconha. O pretexto para essa internação é desintoxicação e reabilitação.
        Lá ele é tratado de forma agressiva e desumana pelos enfermeiros, que utilizam recursos como choque elétrico na cabeça, injeções que causam terríveis dores musculares, isolamento em cubículos escuros, como forma de tratamento e punição pelo mau comportamento.
        A trama também mostra o arranjo familiar, com um pai conservador, grosseiro e desinformado, e a mãe submissa ao chefe da família. A preocupação com a reputação da família por ter um filho envolvido com drogas levou o pai a internar Neto, sem ter, pelo menos, tentado conversar com o adolescente e procurado conhecer seus problemas.

        “É preciso fingir, quem é que não finge nesse mundo? É preciso dizer que está bem-disposto, é preciso dizer que não está com fome, é preciso dizer que não está com dor de dente, é preciso dizer que não está com medo, senão, não dá. [...] A gente até precisa fingir que é louco sendo louco”. Ao dizer isso, um dos internos do hospital entrega a Neto um gorro para que ele “agasalhe a cabeça”. O acessório, que também é uma metáfora, é chamado por eles de “guardador de ideias”.
        O adolescente, ao tentar se reintegrar à sociedade e ao convívio familiar, tem que lidar com as sequelas causadas pela sua estadia no manicômio e o preconceito por ter estado lá. A certa altura, quando de volta ao hospital psiquiátrico, Neto está tão esgotado mentalmente que tenta suicídio ateando fogo na solitária.
        O lugar que teoricamente cura, ou pelo menos deveria tratar, acaba agravando ainda mais a saúde mental do paciente. As terapias que mais parecem torturas, acarretam graves problemas aos internos.
        A Reforma Psiquiátrica se faz tão importante pelo caráter assistencial que garante ao paciente o direito a um tratamento digno e humanizado. Uma sociedade democrática que respeita os direitos humanos precisa se desvencilhar da cultura manicomial e motivar o convívio com as diferenças.

Ficha Técnica

Drama / 88 minutos / Brasil / 2001
Direção: Laís Bodanzky
Roteiro: Luiz Bolognesi
Música: André Abujamra, Arnaldo Antunes
Produção: Fabiano Gullane, Maria Ionescu
Fotografia: Hugo Kovensky
Elenco: Rodrigo Santoro, Caco Ciocler, Cássia Kiss, Gero Camilo, Jairo Mattos, Luis Miranda, Marcos Cesana, Othon Bastos, Valéria Alencar


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