quarta-feira, 7 de maio de 2014

Direitos Humanos: defensor de bandido?

Reproduzir o pensamento errôneo de que os direitos humanos só existem para bandido é a maior prova de que vivemos em uma sociedade alienada e formada por “intelectuais de sofá”, que baseiam opiniões unicamente no cotidiano encenado e montado de um telejornal. É fato que o papel da imprensa é reproduzir para a sociedade os acontecimentos diários - mas, por que o discurso dos muitos jornalistas influenciadores da massa mostra apenas um lado da moeda? Por que os Direitos Humanos só ganham destaque quando - raramente - estão defendendo presos e foras da lei?

Abaixo reproduzimos o artigo “Direitos Humanos: defensor de bandido?” escrito por Clóvis Pereira, membro do conselho Nacional do Movimento Nacional de Direitos Humanos, O texto foi retirado do site do MNDH. Todos os direitos pertencem ao autor. (Lívia Maria)


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Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

“Em 1964 os militares aplicaram o golpe militar, impuseram ordens e, inspirados na Doutrina da Segurança Nacional, instalaram a ditadura. Desde o início da década de 1960 a população começou a exigir seus direitos que até então eram desrespeitados pelo Estado brasileiro. Exigiam também que o Estado respeitasse os direitos já conquistados desde o início da República.

Apesar do fim da ditadura militar, em 1985 e, do restabelecimento da democracia, a experiência da ditadura deixou marcas inesquecíveis na sociedade.

Durante o tempo em que governaram, os militares procuraram rotular negativamente todos aqueles que defendiam as pessoas ameaçadas e perseguidas ou presos políticos pelos aparelhos repressores do Estado - entre eles, lideranças sindicais, políticas, religiosas e estudantis -, dizendo que eram ''defensores de bandidos''.

Terminada a ditadura, cessaram aquelas práticas. No entanto, persistiu o rótulo sobre os que se posicionam favoravelmente aos Direitos Humanos: tais pessoas são equivocadamente confundidas como aqueles que defendem presos e bandidos.

Ainda hoje é comum vermos parte da imprensa e da sociedade se referirem às pessoas que participam de alguma entidade de Direitos Humanos como ''defensores de bandidos'', sem que o sejam de fato e de direito.

É líquido e certo que toda e qualquer pessoa que comete delitos deve ser punida, e não só o pobre ser preso e punido como acontece no Brasil. Mas toda e qualquer pessoa: rico ou pobre, senador ou deputado, ministro ou secretário, governador, prefeito ou vereador, policial ou cidadão comum, juiz ou promotor. Todos, absolutamente todos.

O que os movimentos de Direitos Humanos condenam é a prática da tortura nas prisões, método comumente utilizado pela polícia para obter confissão. Isto sim é condenável. Nenhuma tortura se justifica para obter confissão. Condenar a tortura não é defender bandidos. Quem pratica a tortura pode estar sendo mais criminoso que o próprio preso considerado bandido.

O preso, pelo fato de estar algemado, não tem como se defender, e tudo que porventura vier a falar pode pesar contra ele mesmo.

Os defensores de direitos humanos defendem as liberdades individuais; o direito à vida; a segurança; a igualdade de tratamento perante a lei; o direito de propriedade; o direito de ir e vir; o direito à saúde; à educação; à moradia; ao trabalho; ao lazer; aos direitos trabalhistas; não sofrer qualquer tipo de tratamento cruel; não ser torturado; ser atendido e não discriminado nos hospitais. Os defensores também não defendem o criminoso, o bandido, o assaltante, o desvio de recursos públicos de qualquer natureza e por qualquer pessoa, as más administrações públicas, as mentiras...

Pode-se perceber que o preso nem aparece como prioridade dos movimentos de Direitos Humanos. É como se fosse uma gota em um copo d'água. Ele aparece quando seus direitos constitucionais de não ser torturado são violados e, mais ainda, quando a denúncia de tortura chega ao conhecimento da sociedade.”

Um comentário:

  1. Quem condena - de forma ignorante, diga-se de passagem - a proteção dada pela Declaração Universal dos Direitos do Homem aos seres humanos, condena também a liberdade, o direito de poder expressar sua opinião a respeito disso. Reprova também a proteção dada em face da escravidão no trabalho, do tráfico de pessoas, da dignidade nas relações diárias de consumo de bens e serviços.

    Ainda que citada proteção se resumisse as questões de natureza criminal, que objetivasse apenas a garantia de dignidade quando da resposta do Estado a um ato considerado pernicioso ao equilibro da convivência em harmonia dos homens, ainda assim, a proteção dada pelos Direitos Humanos enquanto lei, figura como o alicerce que possibilita a cada pessoa ter o direito de a um processo que vise apurar sua culpa ou inocência, que dá um direito à resposta, e o principal, que preserve a natureza humana de forma a não permitir que o acusado seja reduzido a um simples ser vivente.

    Os problemas inerentes a má aplicação desses direitos não é – para mim – uma falha da lei, e sim um problema social, político, cultural. A corrupção do homem – em sentido amplo – não é um problema contemporâneo, talvez seja o “mal dos milênios”, uma doença que assola nossa existência desde o princípio.

    Boa postagem, parabéns!

    Rafael D’Angelo

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